Participantes refletiram como o processo de privatização pode ameaçar o direito fundamental à água
Em Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) realizada em 2016 foi votado que a água potável, assim como o saneamento básico, é um direito essencial do ser humano, contudo, por diversas vezes violado. Esse foi o tema da Roda de Conversa que aconteceu no último dia de programação da Arena das Águas na Vila Cidadã (23), “Água como Direito Humano”.
Para falar sobre o assunto, o relator especial do Direito Humano à Água e ao Esgotamento Sanitário, das Nações Unidas, Léo Heller, moderou a mesa composta pela atriz e ambientalista, Maria Paula Fidalgo; representando os Engenheiros Sem Fronteiras, Mirian que trabalha o assunto saneamento na Espanha; o diretor dos serviços de saneamento de Paris, Benjamin Gestin; a ex-relatora na ONU sobre o tema, Catharina de Albuquerque, de Portugal; o secretário-geral adjunto da Internacional de Serviços Públicos (ISP), David Boys, e a mexicana Gloria Coron.
Nessa Roda, os participantes falaram acerca da comercialização da água e da privatização dos serviços de saneamento básico. Segundo Leo Heller, a ideia da Roda é refletir em que medida o processo de privatização ameaça o direito fundamental à água. O acesso a água e o esgotamento são integrados, e precisamos chamar a atenção para o fato de que déficit em saneamento ainda é muito maior do que o de acesso a água. Ao reconhecer esses acessos como direito humano “nós estamos dando aos cidadãos a possibilidade de recorrer à justiça contra a violação desse direito”. A atriz Maria Paula iniciou a apresentação destacando a necessidade de mudar a matriz energética do país. Para ela, a água é um organismo. “A água precisa ser respeitada, não ser encarada como negócio”, ressalta.
O saneamento da cidade de Paris também foi apresentado pelo diretor dos serviços de saneamento do município, Benjamin Gestin. No país, os serviços, que eram privatizados, foram retomados pelo Governo. Para ele, é fundamental que haja conversa entre os poderes. “Depois da evolução da gestão pública, a eficiência do saneamento aumentou e fez com que o acesso a água aumentasse e o preço diminuído. Mas o que contribuiu sem dúvida para esse processo é que não visamos lucro no fornecimento da água, mas sim a sustentabilidade do sistema, o que não aconteceria se fossemos um serviço privado” destaca.
Catharina de Albuquerque, presidente executiva da parceria Saneamento e Água para Todos (SWA), parabenizou a medida adotada na França. “Temos que fazer como foi feito em Paris, mudar tudo e começar novamente para garantir o acesso à agua. Para isso, temos que garantir a participação de todos nos processos decisórios. O que interessa para as pessoas não é saber quem traz a água, mas sim ter a água, independente de quem o faça”, reforça. Catharina complementa, ainda, que é importante garantir que a população não tenha que andar quilômetros para ter acesso à água. “Temos que encontrar os melhores serviços” para garantir acesso aos milhares que ainda não possuem acesso à água e ao saneamento; “que o preço seja adequado e que ninguém seja excluído”, e para tanto políticas públicas devem ser implementadas ou atualizadas.
David Boys, reforça sobre as diferenças entre o público e o privado, ressaltando que as empresas privadas “não existem para dar acesso à água à população, mas apenas para maximizar seus lucros”. Gloria Coron, do México, diz que conhece a realidade brasileira e que, aqui, a água é tratada como commodity, e utilizada apenas como insumo para produção de bens de baixo valor agregado para exportação.
A representante do movimento Engenheiros Sem Fronteiras lembra que na Espanha, os cortes de água eram constantes e foi a pressão popular que gerou mudança nas políticas públicas. “A pressão levou com que conseguíssemos um serviço público de água depois de quatro anos de mobilização. As mudanças devem vir dos cidadãos, para que sejam realmente efetivas e transparentes, garantindo assim o direito humano de acesso a água”, finaliza.